dezembro 31, 2008

Em 2009

Queria ter coragem
Para falar deste segredo
Queria poder declarar ao mundo
Este amor
Não me falta vontade
Não me falta desejo
Você é minha vontade
Meu maior desejo
Queria poder gritar
Esta loucura saudável
Que é estar em teus braços
Perdido pelos teus beijos
Sentindo-me louco de desejo
Queria recitar versos
Cantar aos quatros ventos
As palavras que brotam
Você é a inspiração
Minha motivação
Queria falar dos sonhos
Dizer os meus secretos desejos
Que é largar tudo
Para viver com você
Este inconfesso desejo.

Carlos Drummond de Andrade

dezembro 30, 2008

Não me interessa saber o que fazes para ganhar a vida. Quero saber o que desejas ardentemente, se ousas sonhar em atender aquilo pelo qual o teu coração anseia. Não me interessa saber a tua idade. Quero saber se arriscarás parecer um tolo por amor, por sonhos, pela aventura de estar vivo. Não me interessa saber que planetas estão em quadratura com a tua lua. Quero saber se tocaste o âmago da tua dor, se as traições da vida te abriram ou se te tornaste murcho e fechado por medo de mais dor! Quero saber se podes suportar a dor, minha ou tua; sem procurar escondê-la, reprimi-la ou narcotizá-la. Quero saber se podes aceitar alegria, minha ou tua, se podes dançar com abandono e deixar que o êxtase te domine até às pontas dos dedos das mãos e dos pés, sem nos dizeres para termos cautela, sermos realistas, ou nos lembrarmos das limitações de sermos humanos. Não me interessa se a história que contas é verdade. Quero saber se consegues desapontar outra pessoa para ser autêntico contigo mesmo, se podes suportar a acusação de traição e não traíres a tua alma.

Quero saber se podes ver beleza mesmo que ela não seja bonita todos os dias, e se podes buscar a origem da tua vida na presença de Deus, quero saber se podes viver com o fracasso, teu e meu e ainda, à margem de um lago, gritar para a lua prateada: Posso! Não me interessa onde moras ou quanto dinheiro tens. Quero saber se podes levantar-te após uma noite de sofrimento e desespero, cansado, ferido até aos ossos, e fazer o que tem de ser feito pelos filhos. Não me interessa saber quem és e como vieste parar aqui. Quero saber se ficarás comigo no meio do incêndio e não te acovardarás. Não me interessa saber onde, o quê, ou com quem estudaste. Quero saber o que te sustenta a partir de dentro, quando tudo o mais se desmorona. Quero saber se consegues ficar sozinho contigo mesmo e se, realmente, gostas da companhia que tens nos momentos vazios.


Jean Houston

dezembro 27, 2008


Eu acreditei que podia amar o teu corpo, o teu modo de insinuar o coração nas palavras. Mas era apenas a forma como a noite sublinhava as superfícies, eu nunca pude atravessar essa espessura. Estavas ali para te dispores aos meus sentidos mas crescias fora de alcance no teu próprio pensamento. Uma distância que só serviria aos lobos, um mau caminho arrancado às fragas. Já só conhecia os dias onde tu os frequentavas, o sítio em que me mantinhas era mais urgente que o sangue. Sem dúvida que vinhas pelo meu desejo mas eu perdia sempre alguma coisa quando te ganhava. Às vezes era só a minha vontade, outras vezes era toda a frase do meu nome.


Rui Pires Cabral

dezembro 23, 2008

Deixei de te ver. Não há luz sequer. A noite cai. Como se fosse uma pessoa, a noite cai. Como se não fosses tu. Como se tivesses de partir e já fosses atrasado e fosses a correr e depois te esquecesses de voltar. E, mesmo querendo, já não soubesses o caminho de volta, mesmo querendo, não pudesses por já não o haver, o caminho de volta até mim. Sem maldade, puro esquecimento, sim, posso acreditar que lá fora facilmente encontres o que quiseres e isso te dê prazer. Aqui não, aqui, junto a mim, é mais difícil, eu sei. Aqui não se deixa agarrar um só instante. Derrete-se na boca,a vida, que está a passar. Num instante. Tu sabes o que é, e é bom que saibas como é porque mesmo se mo pedisses, de todas as maneiras, não to podia dizer. O que podes, isso sim, do que mais precisas, isso sim, é de adormecer e descansar. Assim não podes continuar. Já reparaste como estás? Metes dó. Eu sei, a culpa não é tua,ficaste assim sem querer, o exacto contrário do que querias, eu sei,disseste-mo demasiadas vezes. A vida que nos deram não é nossa? Mas podias pelo menos tentar que passe por ti. E por mim,se não for pedir demais. Não sei se queres compreender mas não vou repetir,nem uma palavra. Não vale a pena, ficava logo tudo igualzinho à primeira vez. O que tu podes é abrir os olhos e ver.
Pedro Paixão

dezembro 19, 2008

dezembro 18, 2008

“ - O que empurra as lágrimas cá para fora?
- Lágrimas. É um processo simples que te é entregue como complexo. Há um reservatório dentro de ti onde estão todos os líquidos. Um dia o reservatório enche-se e é necessário libertar água. É nessa altura que choras.
- Mas quando choro há uma dor, um aperto. Ou uma euforia.
- Sugestão subsequente. Quando dás por ti com lágrimas nos olhos acreditas estar perante um choro.
- E choro.
- E falseias um choro. Inventas uma dor ou uma euforia para justificar as lágrimas.
- Sinto-me a chorar.
- A pele seca confirma-o.”


Pedro Chagas Freitas


dezembro 17, 2008



"Spent a long time now persuading myself
That I don't need no one
Nobody else
And who I was,
I could conceal
I know if I should live one hundred years
I'd never see another face like yours
On stranger seas or brighter shores
'Cause I know
That my love is real"

David Gray

ps- Sim,para os mais atentos,já cá tinha posto esta letra...E agora apetece-me pôr a música! O blog a bem dizer é meu... ; p

dezembro 16, 2008


Deixa-te ficar na minha casa.
Há janelas que tu não abriste.
Deixa-te ficar na minha casa.
Há janelas que tu não abriste.

O luar espera por ti
Quando for a maré vasa.
E ainda tens que me dizer
Porque é que nunca partiste...

João Gil

dezembro 13, 2008

Por quem foi que me trocaram

Quando estava a olhar para ti?

Pousa a tua mão na minha

E, sem me olhares, sorri.

Sorri do teu pensamento

Porque eu só quero pensar

Que é de mim que ele está feito

E que tens para mo dar.

Depois aperta-me a mão

E vira os olhos a mim…

Por quem foi que me trocaram

Quando estás a olhar-me assim?

Fernando Pessoa


dezembro 12, 2008

Deviam chover lágrimas quando o coração pesa muito.

António Lobo Antunes

foto em deviantart


dezembro 11, 2008

O que verdadeiramente me dói não são as palavras que nestes anos todos ficaram por dizer arrumadas entre os medos que não gritámos juntos e os sonhos que não transpirei na tua pele. O que verdadeiramente me dói são, os silêncios que nunca habitámos do mesmo lado porque o silêncio só pode ser partilhado com aqueles que amamos até à loucura, só ele é a dádiva perfeita que não pede mais nada a não ser um mesmo lugar para deitar a cabeça e esperar que a madrugada lentamente desfaça todos os segredos e nada mais seja preciso para voltarmos a ter vinte anos, mesmo que os vinte anos tenham morrido para sempre na cidade em chamas. Hoje sei que te devia ter colado então ao meu silêncio para que levasses no fundo dos teus olhos a cor dos meus, ainda que totalmente despidos dos teus. Mas não fui a tempo, e alguém junto a nós, disse as pequenas mentiras mordem até ao fim, e eu comecei a falar de outras coisas mas foi isso – tenho a certeza – que nos matou por isso te peço agora – ajuda-me a não pecar outra vez do mesmo modo para que os deuses não se cansem de voltarem a pôr tudo no lugar certo olha para mim – não tenhas medo – dá-me camélias – cravos – azáleas – o que houver, descobre a única palavra verdadeiramente nossa, a única a poder ensinar-nos ainda o rasto das noites em que a cidade era um braseiro e nós ardíamos no lume das pedras e das nossas línguas enquanto os pardais se confundiam na vidraça das janelas que escancarávamos por maio fora...

Alice Vieira

dezembro 10, 2008

foto em Deviantart

Same
smell. Same lips. Same touch. Different you but still... you.

novembro 28, 2008

Quando te vi amei-te já muito antes.

Tornei a achar-te quando te encontrei.

Nasci para ti antes de haver o mundo.

Não há cousa feliz ou hora alegre

Que eu tenha tido pela vida fora,

Que o não fosse porque te previa,

Porque dormias nela tu futuro.


Fernando Pessoa

novembro 25, 2008

foto em Deviantart


Por muito tempo achei que a ausência é falta. E lastimava, ignorante, a falta. Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim. E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços, que rio e danço e invento exclamações alegres, porque a ausência, essa ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim.


Carlos Drummond de Andrade



novembro 22, 2008

A saudade fará mais por nós dois

que nosso amor

e sua desajeitada irreflectida permanência.



Martha Medeiros



novembro 21, 2008

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A única maneira de teres sensações novas é construíres-te uma alma nova.

Baldado esforço o teu de querer sentir outras coisas sem sentires de outra maneira, e sentires de outra maneira sem mudares de alma.
Porque as coisas são como nós as sentimos - há quanto tempo sabes tu isto sem o saberes?
- e o único modo de haver coisas novas, de sentir coisas novas é haver novidade no senti-las.
Muda de alma. Como? Descobre-o tu.»

Fernando Pessoa


novembro 20, 2008


foto em Deviantart

Lembro-me agora que tenho de marcar um encontro contigo, num sítio em que ambos nos possamos falar, de facto, sem que nenhuma das ocorrências da vida venha interferir no que temos para nos dizer. Muitas vezes me lembrei de que esse sítio podia ser, até, um lugar sem nada de especial, como um canto de café, em frente de um espelho que poderia servir de pretexto para reflectir a alma, a impressão da tarde, o último estertor do dia antes de nos despedirmos, quando é preciso encontrar uma fórmula que disfarce o que, afinal, não conseguimos dizer. É que o amor nem sempre é uma palavra de uso, aquela que permite a passagem à comunicação mais exacta de dois seres, a não ser que nos fale, de súbito, o sentido da despedida, e que cada um de nós leve, consigo, o outro, deixando atrás de si o próprio ser, como se uma troca de almas fosse possível neste mundo. Então, é natural que voltes atrás e me peças: Vem comigo!, e devo dizer-te que muitas vezes pensei em fazer isso mesmo, mas era tarde, isto é, a porta tinha-se fechado até outro dia, que é aquele que acaba por nunca chegar, e então as palavras caem no vazio, como se nunca tivessem sido pensadas. No entanto, ao escrever-te para marcar um encontro contigo, sei que é irremediável o que temos para dizer um ao outro: a confissão mais exacta, que é também a mais absurda, de um sentimento; e, por trás disso, de que o mundo há-de ser outro no dia seguinte, como se o amor, de facto, pudesse mudar as cores do céu, do mar, da terra, e do próprio dia em que nos vamos encontrar, que há-de ser um dia azul, de verão, em que o vento poderá soprar do norte, como se fosse daí que viessem, nesta altura, as coisas mais precisas, que são as nossas: o verde das folhas e o amarelo das pétalas, o vermelho do sol e o branco dos muros.


Nuno Júdice



novembro 15, 2008

Vou guardar as tuas mãos na paixão que tenho por ti,
mas não te posso revelar o meu nome, nem precisas de o saber.
Chama-me o que quiseres, dá-me um nome para que possamos amarmo-nos.
Aquele que tinha perdi-o no caminho até aqui.
Pertencia a outra paixão, e já a esqueci.
Dá-me tu um nome para eu poder ficar contigo...

Al Berto


novembro 11, 2008

Este pássaro que nasceu não sei de onde,
que atravessa com o seu voo a imprecisão
da minha noite, que rasga com a lâmina
das suas asas a mortalha da insónia,
foi apanhado por um caçador de furtivos
silêncios. Agora, debate-se na gaiola
do esquecimento; recusa o poleiro para
que o cansaço o empurra; despeja
o bebedouro do tédio que lhe trazem
com a alpista das palavras. Já não canta;
e os seus olhos reflectem um horizonte
cego, como se tivesse perdido o rumo
das migrações. Mas não morre; e
ouço-o debater-se dentro de mim, quando
lhe aceno com o azul, e uma esperança
de céu o obriga a sonhar.

Nuno Júdice


novembro 10, 2008

foto em deviantart
Nua és tão simples como uma de tuas mãos,
lisa, terrestre, mínima, redonda, transparente,
tens linhas de lua, caminhos de maçã,
nua és magra como o trigo nu.
Nua és azul como a noite em Cuba,
tens trepadeiras e estrelas no pêlo,
nua és enorme e amarela
como o verão numa igreja de ouro.
Nua és pequena como uma de tuas unhas,
curva, subtil, rosada até que nasça o dia
e te metes no subterrâneo do mundo
como num longo túnel de trajes e trabalhos:
tua claridade se apaga, se veste,
se desfolha
e outra vez volta a ser uma mão nua.
Pablo Neruda

ps - Sim J. Pablo Neruda, O carteiro de Pablo Neruda ; p


novembro 07, 2008

foto em deviantart

Algum dia eu haveria de entrar na normalidade dos que te amam. Amo-te. E dói escrevê-lo (que é pior, meu amor, do que dizê-lo). Amo-te absoluta, impossível e fatalmente. E ouço, adolescente, uma música adolescente, para me lembrar de ti, porque lembrar-me de ti é lembrar-me que não consigo esquecer-te. E ouço música porque ouvimos música quando amamos, e tudo, no amor é música, acústica da alma que quer ser devorada, e, neste caso, dor (tão deliciosamente insuportável) de amar sem sequência nem expectativa de contrapartida, amar unicamente o puro objecto que desgraçadamente amamos. Isto é uma carta de amor, e é possivelmente ridícula prova maior de que é, realmente, uma carta de amor), ou porque perdi o hábito de as escrever, ou porque nunca tive a coragem de as enviar. Não percebes porque é que não te falo? Ainda não percebes que, na personagem que de mim eu enceno, não cabe a ameaça de uma derrota, a antecipação do desencanto, a sombra de um vexame? Não te falo, para não saber que o que eu te digo é apenas a forma contida de te dizer outra coisa, mas que essa coisa não é do teu mundo, nem do mundo que eu construí, nem do precário mundo que a nossa fragilíssima ternura mútua arquitectou. E tudo isto é literário, eu sei, mas – que queres? -, a literatura é o melhor de mim e é o melhor de mim que vive dentro da minha cabeça quando estou contigo. E depois afastamo-nos. Beijo-te a correr, não sei se já reparaste, e quase fujo, porque sair de ao pé de ti é regressar ao que não és tu, o teu olhar e as tuas mãos, a tua alma e a tua voz, e isso, meu amor, transformou-se no insuportável intervalo entre dois encontros. Esta carta de amor é um excesso (e isso prova superiormente que é uma carta de amor): eu amo não a ideia de amar-te (durante muito tempo eu julguei que era apenas isso), mas a ideia de perder-me no meu amor por ti. E mesmo amar-te é um excesso, porque tudo aconselharia que eu me limitasse a mitificar-te, que é a melhor forma de evitarmos enfrentar a realidade. Porque a realidade, aqui, é como uma dor difusa, tu sabes como é, um incómodo ainda não localizado, que progressivamente se vai definindo e acertando, até que, insuportavelmente nítida, a sua imagem se nos impõe como uma evidência. A minha dor é que eu comecei a amar-te, sem o saber, durante aquele breve período de tempo em que sair de casa era a promessa reconfortante de ver-te e falar contigo. Eu não sabia, repito, mas o tempo ajudou-me a definir essa pequena dor, tão secretamente pavorosa: cada vez que estou contigo (cada vez mais, meu amor, cada vez mais) é como se a minha vida se virasse do avesso. E é verdade, é cada vez mais verdade, que, quando penso nas coisas que ainda me falta fazer na vida, é em ti que penso. E tenho medo, como um animal que instintivamente foge do que sabe não poder atingir. Eu penso em ti, ainda mais do que te digo, e tu estás em tudo, mesmo quando não te penso, tu és a grande razão, o horizonte sem nome que constantemente se desenha na minha imaginação de mim. Há uns anos, este seria o momento de desmontar o discurso desta carta, de te mostrar os subtis mecanismos da alma e da máscara, de desdizer ironicamente o que já disse, de insinuar que, afinal, as-coisas-talvez-não-sejam-exactamente-assim. Mas as coisas são exactamente assim, e a carta, que poderia transformar-se num confortável exercício paródico, é, inevitavelmente, uma agonia e um embaraço. Esta carta é um acto de puro egoísmo, que eu até talvez nem tivesse o direito de praticar. É-te incómoda, necessariamente, e isso bastaria para que eu me abstivesse de a enviar, dentro de um envelope azul. Mas o azul fica-te tão bem, e as cores todas em ti como tu ficas no mundo: exactamente. Mas, repito: esta carta é um acto de puro egoísmo, é como se não tivesse destinatário. E, no entanto, é preciso enviá-la para que seja uma carta de amor, para que faça sentido como carta. Para que seja amor. Mas podemos imaginar uma saída elegante: para que possas conservá-la como pura carta de amor, quero eu dizer, sem o embaraço de saberes que ela te foi escrita por alguém que não amas, não a assino. Dou-te tudo: até a hipótese de esta carta não ter sido escrita por mim. (E não, esta carta não pode ter sido escrita por mim. És tuem mimque me faz escrever o que eu não escrevo. E isso é – de novo – o melhor de mim.)


António Mega Ferreira

novembro 06, 2008


"Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra"


António Ramos Rosa





novembro 05, 2008


Um dia talvez faça sentido a tua fuga urgente
e fria
pela calada do silêncio.
Só então perdoarei o tempo
pela dor de não te ter tido
nem ter sabido de cor.

Podias ter sido um barco
a navegar no mesmo ritmo das ondas,
mas não. Quiseste ser vento contrário...

Mas tudo tem duas faces.
A tristeza é só a outra face da alegria
tal como a morte é só a outra face da vida.
Este amor tem duas faces:nós...
e nós somos apenas tu e eu,
o desencontro na volta lenta da vida
o reencontro além do tempo.

Logo chegará o dia
em que o teu espaço será o meu espaço
e o teu tempo será o meu tempo
e jamais haverá sinais a apontar destinos
proibidos.
Seremos apenas nós,
com a certeza de um amor sobrevivente
na memória longínqua do olhar.
E será pelo olhar que nos reconheceremos...

Hoje eu sei que não vou morrer por não te ter,
porque um dia
atravessarei o portão desconhecido
e, ainda que tu não saibas,
levar-te-ei comigo...

e se não posso ter-te aqui,
ter-te-ei além
onde os barcos navegam sem vento...

ainda que não te tenha nunca...


Maria José Quintela

outubro 28, 2008


Never give all the heart, for love
Will hardly seem worth thinking of
To passionate women if it seem
Certain, and they never dream
That it fades out from kiss to kiss;
For everything that's lovely is
But a brief, dreamy, kind delight.
O never give the heart outright,
For they, for all smooth lips can say,
Have given their hearts up to the play.
And who could play it well enough
If deaf and dumb and blind with love?
He that made this knows all the cost,
For he gave all his heart and lost.

Yeats

outubro 25, 2008

"Não sei como dizer-te que minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e vasta.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
- eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.

Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada
em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a casa ardesse pousada na noite.
- E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
- não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.

Durante a primavera aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço –
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me faltam
um girassol, uma pedra, uma ave – qualquer
coisa extraordinária.
porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor

que te procuram."


Herberto Hélder


outubro 22, 2008

Passem-se dias, horas, meses, anos
Amadureçam as ilusões da vida
Prossiga ela sempre dividida
Entre compensações e desenganos.

Faça-se a carne mais envelhecida
Diminuam os bens, cresçam os danos
Vença o ideal de andar caminhos planos
Melhor que levar tudo de vencida.

Queira-se antes ventura que aventura
À medida que a têmpora embranquece
E fica tenra a fibra que era dura.

E eu te direi: amiga minha, esquece...
Que grande é este amor meu de criatura
Que vê envelhecer e não envelhece.

Vinicius de Moraes