junho 30, 2009

Fim da canção

"Chegámos ao fim da canção
E paro um pouco para dormir
É tarde pra voltarmos atrás
Já nem há motivo algum para rir
É como ouvir alguém dizer
Vê nessa procura
Uma razão
Para virar a dor para dentro
Que é virar o amor para dentro
Falo de um amar para dentro
Que é virar a dor para dentro."

Ornatos Violeta

junho 15, 2009

Rifa-se

Rifa-se um coração quase novo. Um coração idealista. Um coração à moda antiga. Um covarde, moleque que insiste em pregar peças no seu usuário. Rifa-se um coração que na realidade está um pouco usado, muito machucado e que teima em alimentar sonhos e cultivar ilusões. Um pouco inconsequente, que nunca desiste de acreditar nas pessoas. Um leviano e precipitado coração que acha que Tim Maia estava certo quando escreveu: «Não quero dinheiro, eu quero amor sincero, é isso que eu espero!» ... Um idealista!!! Um verdadeiro sonhador... Rifa-se um coração que nunca aprende, que não endurece e mantém sempre a esperança de ser feliz, sendo simples e natural. Um coração insensato que comanda o racional sendo louco o suficiente para se apaixonar. Um furioso suícida que vive procurando relações e emoções verdadeiras. Rifa-se um coração que insiste em cometer sempre os mesmos erros. Esse coração que erra, que briga e que se expõe. Perde o juízo por completo em nome de causas e paixões. Sai do sério e, às vezes, revê suas posições arrependido de palavras e gestos. Esse coração tantas vezes incompreendido, tantas vezes provocado, tantas vezes impulsivo. Rifa-se este desequilibrado emocional que abre sorrisos tão largos que quase dá pra engolir as orelhas, mas que também arranca lágrimas e faz murchar o rosto. Um coração para ser alugado ou mesmo utilizado por quem gosta de emoções fortes. Um órgão abestado, indicado apenas para quem quer viver intensamente e contra-indicado para os que apenas pretendem passar pela vida matando o tempo, defendendo-se das emoções. Rifa-se um coração tão inocente que se mostra sem armaduras e deixa louco seu usuário. Um coração que quando parar de bater ouvirá o seu usuário dizer pra São Pedro na hora da prestação de contas: «O Senhor pode conferir, eu fiz tudo certo, só errei quando coloquei sentimento. Só fiz bobagens e me dei mal quando ouvi este louco coração de criança que insiste em não endurecer e se recusa a envelhecer». Rifa-se um coração ou mesmo troca-se por outro que tenha um pouco mais de juízo. Um órgão mais fiel ao seu usuário. Um amigo do peito que não maltrate tanto o ser que o abriga. Um coração que não seja tão inconsequente. Rifa-se um coração cego, surdo e mudo, mas que incomoda um bocado. Um verdadeiro caçador de aventuras que ainda não foi adotado, provavelmente, por se recusar a cultivar ares selvagens ou racionais, por não querer perder o estilo. Oferece-se um coração vadio, sem raça, sem pedigree. Um simples coração humano. Um impulsivo membro de comportamento até meio ultrapassado. Um modelo cheio de defeitos que, mesmo estando fora do mercado, faz questão de não se modernizar, mas vez por outra, constrange o corpo que o domina. Um velho coração que convence seu usuário a publicar seus segredos e a ter a petulância de se aventurar como poeta.

Clarice Lispector

junho 11, 2009

Baby Blue



Perfeita!

junho 08, 2009

So true

"Constantly talking isn't necessarily communicating. "
In Eternal Sunshine of the Spotless Mind

junho 06, 2009

Ruínas


Quando alguém nos desilude, dói muito. Custa dar o braço a torcer quando ouvimos o típico " Eu bem te avisei e tu não quiseste ouvir-me". Mas os amigos querem sempre o nosso bem e quando nos veem iludidas e a tentar alcançar as estrelas, puxam-nos as pernas e trazem-nos de volta à Terra. É preciso que assim seja. Fantasiamos, idealizamos, sonhamos e às vezes, a maior parte das vezes,construímos um mundo só nosso, que ninguém entende. Nem é para entender, é para respeitar e aceitar. Os amigos verdadeiros fazem isso. Mas chega a altura, aquela altura certa em que precisamos de levar um abanão, ouvir um grito de realidade e chorar. Chorar pela desilusão da ilusão criada. E dói. Muito. O nosso mundinho construído, de repente desaparece e só ficam algumas imagens distorcidas, cartas escritas e nunca enviadas, músicas que tanto nos disseram. É tentar encaixotar tudo isso em alguma parte do nosso cérebro, parte escura e de difícil acesso para só voltar a ser lembrado quando formos grandes e fortes. Porque tudo o que ali foi construído, foi com amor, com dedicação, com muita entrega. E a dor faz-nos ficar pequeninos, frágeis. Que fazer então? Aninharmo-nos no colo do amigo que nos ama e que só quer que estejamos em paz. E esperarmos que a dor desapareça. Quando alguém nos desilude, dói muito.

junho 03, 2009

"You can just feel the details. The bits and pieces you never bothered to put into words. And you can feel these extreme moments… even if you don’t want to. You put these together, and you get the feel of a person. Enough to know how much you miss them."

In Memento

junho 01, 2009

Answer


Na verdade, o amor é tudo o que se avista quando se observa o coração do planalto de um abraço. Diante desse horizonte – macio e vasto – há quem ache o amor uma moda acabrunhada, quem se empanturre de tudo o que permita que não se dê pela sua falta, e quem pressinta que amar é ver mais longe (de cada vez que os olhos se fecham devagarinho, simplesmente). Os primeiros perdem-se nos sonhos. Os segundos olham-nos de cima (e, supostamente, exultam diante da ventura de não sonhar). Os terceiros fazem dos sonhos o passadiço do amor. Os que se perdem nos sonhos falam da ausência do amor, timidamente, evocando o cansaço. Ou reclamam-no, simplesmente, invadindo de ira todos os seus gestos. No fundo, temem-no, de tanto o desejarem (protelando-o, sempre, para depois). Vivem amarrotados pela distância que vai entre tudo o que sonharam e as brumas dos dias (que não lhes tiram os desejos nem lhos trazem, de surpresa). E dão-se conta dos sonhos que se perderam sempre que, por acidente, esbarram em relações de sonho. Os que o olham de cima supõem que são as manhãs de sol quem abre as persianas pelo coração. Acham o amor uma relação fora de moda e o melhor que conseguem é encontrar a pessoa dos seus sonhos... para os próximos dias. Não compreendem que a sedução é uma defesa contra os abraços. E não concebem que a segurança seja contar com o amor de alguém (em vez de estar seguro que a pessoa com quem se conta não conte, seguramente, para mais ninguém). Já os outros reconhecem que, quando ponderamos acerca do que gostamos numa pessoa, não gostamos dela: reparamos nos pormenores. E que, quanto mais preponderante é um amor, mais a iminência da sua perda nos revolve. Sabem, por mais que não as tenham, que há relações que iluminam a alma e que incendeiam a paixão. E que serão elas a quem chamamos amor. E que esse amor faz do que temos cá dentro uma democracia que nos torna, a todos, iguais nos sonhos e diferentes na forma de os vivermos. E é por isso que, diante das falhas do amor, somos todos crianças desamparadas entre um colo e as cavalitas (como se amar com resignação fosse uma casa de chocolate que, depois de nos distrair, acaba por nos comer). E que o que dói na dor é viverem dentro de nós pessoas que, perante o nosso sofrimento, digam, por palavras nossas: Afinal, quem és tu? Na verdade, amar é ver mais longe. Mais longe, até, do que se avista quando se observa o coração do planalto de um abraço. Saudar os sonhos com a inocência de quem procura neles um trilho especial. E perceber que tudo o que se sonha é pouco mais do que nada ao pé das relações que iluminam a alma e que incendeiam a paixão. E que só essas fazem dos sonhos o passadiço do amor.
Eduardo Sá