junho 17, 2007

"Dois amigos meus separaram-se. O amor tinha-se acabado lá em casa. Ficaram amigos e sem ponta de rancor. Apenas decidiram seguir vidas diferentes sem ter de dormir um com o outro. Ele tem uma namorada e ela também se apaixonou, mas nunca contaram um ao outro. Ou seja, viveram juntos dez anos, partilharam cólicas, dores, entusiasmos, um nascimento (!), mas na hora de cada um ir à sua vida não ficou nada para dizer, nem a vontade de partilhar a vida que se segue. Partiu dele esta indiferença e ela apanhou a mesma boleia. Sabem por amigos que ambos têm agora outras relações, mas nunca ousaram tocar no assunto quando falam ao telefone sobre o filho que têm juntos. O que terá feito com que ele nunca lhe tivesse contado que está apaixonado? O facto de ela conhecer a mulher em questão? Talvez a isto se chame cobardia. Ou talvez seja só desinteresse. É um arrumar de contas sem puxar muito pela cabeça. É como mandar cem sms no Natal mesmo que lá pelo meio esteja a ex-mulher...
Por mais anos que viva, vou continuar sem compreender como é que duas pessoas que se amaram não têm depois a coragem de dizer coisas tão simples como:"Estou apaixonado e queria que soubesses antes de todos", ou "apaixonei-me outra vez e estou muito feliz." Em vez disso, escudam-se num silêncio, e esse sim, pode fazer esquecer o que de bom se viveu durante anos.
Não gosto muito de generalizar, por poder ser injusta com as excepções (os excepcionais?), mas nisto de abrir o coração e falar sem medos, os homens são muito piores do que as mulheres. Os homens vieram com este defeito de fabrico: a intimidade é um fardo. Partilhá-la é aterrador. Partilhá-la com a ex-mulher que já não é preciso seduzir para ter sexo, é ainda pior. Por isso, toca a viver para a frente e esquecer o passado. Se ela souber por outros, tanto faz. Se os outros meterem a pata na poça porque acabaram de contar à amiga que o ex-marido dela anda com a amiga deles, paciência. Ela que se desenrasque.
O que eles não sabem - talvez o defeito de fabrico não permita saber atempadamente - é que normalmente as coisas tendem a repetir-se. O mal, como o bem, é-nos sempre devolvido. E a ironia não se compadece com os momentos mais felizes da nossa vida."


In " O sexo e a Cidália"

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