"a noite jorra silêncio de estrelas e de mar, cobre de cintilações a terra lavrada, vergam-se pinheiros à luz do luar, a resina enegrece os dedos. ouve-se o rebentar das ondas, adormeço. marulhares sobem ao peito entorpecido pelo vinho e pelo haxixe.
olho-te dormir, a cabeça entornada sobre o meu ombro. sei que do meu corpo doente fizeste a tua praia.
…
são duas da tarde, uma maneira de festejar a noite em pleno dia. estou sozinho, almoço. o calor envolve-me como uma planta invisível, insaciável. sufoca-me, beija-me os dedos cansados de tamborilar na mesa. o restaurante está quase vazio.
do extremo longínquo doutra mesa olhas-me com insistência. sim, talvez no próximo verão, quando o buço imitar um frágil bigode, quando tiveres deixado de andar de bicicleta e vieres acampar sozinho. esboço um sinal imperceptível, sorris. uma destas noites irei contigo para me devolveres o olhar que te emprestei.
mas aproximaste-te, headphones, óculos escuros, uma luva negra na mão esquerda, o cabelo revolto pelos ombros, um sorriso nos lábios capaz de escurecer o dia.
invento uma paisagem para estar contigo, gasto os dias a passear pelos campos à espera que voltes da praia. o tempo foi sempre a minha ruína…
caminho pela imensidão das águas, perco-te. anoto no caderno: esta noite falaremos sobre uma paixão. que mais faremos com os corpos?
tudo abandonei, já não consigo voar com as aves, nem possuo a imagem dos rostos felizes. não me lembro onde larguei a velha gabardina que nos abrigou tantos invernos. as estrelas cintilam sobre as pedras polidas pelas marés. a cal estalada dos muros revela antigas paisagens. ignoro se permanecerei aqui muito tempo.
estávamos em julho, fechei o caderno contigo dentro, nunca mais voltei a apaixonar-me."
olho-te dormir, a cabeça entornada sobre o meu ombro. sei que do meu corpo doente fizeste a tua praia.
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são duas da tarde, uma maneira de festejar a noite em pleno dia. estou sozinho, almoço. o calor envolve-me como uma planta invisível, insaciável. sufoca-me, beija-me os dedos cansados de tamborilar na mesa. o restaurante está quase vazio.
do extremo longínquo doutra mesa olhas-me com insistência. sim, talvez no próximo verão, quando o buço imitar um frágil bigode, quando tiveres deixado de andar de bicicleta e vieres acampar sozinho. esboço um sinal imperceptível, sorris. uma destas noites irei contigo para me devolveres o olhar que te emprestei.
mas aproximaste-te, headphones, óculos escuros, uma luva negra na mão esquerda, o cabelo revolto pelos ombros, um sorriso nos lábios capaz de escurecer o dia.
invento uma paisagem para estar contigo, gasto os dias a passear pelos campos à espera que voltes da praia. o tempo foi sempre a minha ruína…
caminho pela imensidão das águas, perco-te. anoto no caderno: esta noite falaremos sobre uma paixão. que mais faremos com os corpos?
tudo abandonei, já não consigo voar com as aves, nem possuo a imagem dos rostos felizes. não me lembro onde larguei a velha gabardina que nos abrigou tantos invernos. as estrelas cintilam sobre as pedras polidas pelas marés. a cal estalada dos muros revela antigas paisagens. ignoro se permanecerei aqui muito tempo.
estávamos em julho, fechei o caderno contigo dentro, nunca mais voltei a apaixonar-me."
Al Berto
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